Como as ciências sociais estão ajudando a transformar o espaço construído

Como uma disciplina cada dia mais especializada, a arquitetura está assumindo um caráter cada vez mais colaborativo, marcada por uma transdisciplinaridade que atravessa todas as suas diferentes fases e processos. Neste contexto, as ciências sociais adquiriram um papel mais importante do que nunca. À medida que arquitetos e arquitetas se tornam mais conscientes de seu papel e responsabilidade para com a sociedade de modo geral, decisões que antes provinham de meros desejos, anseios e especulações formais, estão cada vez mais fundamentadas na experiência e expertise profissional dos arquitetos, arquitetas e suas equipes multidisciplinares. A seguir, discutiremos a crescente influencia das ciências sociais na arquitetura, desde a antropologia e a psicologia até a futurologia.

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Procurando respostas simples para projetos complexos

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Moving Kiruna. Image Courtesy of Jessica Nilden

A atual paisagem social de nossas cidades demanda um maior envolvimento e engajamento das comunidades locais em nossos processos de projeto e intervenções no espaço urbano. Ainda assim, esta não é uma tarefa fácil e tampouco simples, principalmente porque as atribuições de um arquiteto não são suficientes para abarcar toda a complexidade da questão. Este foi o caso do projeto de realocação da população da cidade sueca de Kiruna, um antigo povoado estabelecido junto a uma jazida de ferro e que começou a sofrer com as consequência das atividades de mineração. O projeto ganhou muita atenção na mídia ao longo dos últimos anos, muito pela sua complexidade técnica e humana, abrangendo desde questões sociais, culturais, de identidade, memória e pertencimento, a problemas ambientais, econômicos e políticos. Neste contexto, a estratégia desenvolvida pela equipe do escritório White Arkitekter foi baseada em um amplo e vasto trabalho de pesquisa e coleta de dados elaborado por uma equipe multidisciplinar liderada pela antropóloga Viktoria Walldin. As estratégias de realocação da cidade foram então delineadas considerando a opinião dos cidadãos, resultando no estabelecimento de um conjunto de ferramentas capazes de incentivar e sistematizar o envolvimento da comunidade local nos processos de projeto e tomadas de decisões. Como resultado disso, a equipe de projeto estabeleceu um dialogo com a comunidade, a qual contribuiu decisivamente no desenvolvimento da proposta final para o novo plano diretor de sua futura cidade.

Promovendo uma compreensão holística do espaço

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Maggie’s Leeds Centre by Heatherwick Studio. Image © Hufton+Crow

A psicologia ambiental é, de fato, a disciplina que estuda o comportamento humano em suas interrelações com os espaços onde a vida humana transcorre, fornecendo dados precisos que podem ser utilizados em nossos projetos, permitindo que arquitetos e arquitetas tomem decisões mais congruentes e apropriadas sobre configurações espaciais, materiais, cores, iluminação e muitos outros elementos relacionados à arquitetura. A psicologia ambiental surgiu por primeira vez na década de 1960 como resultado da crescente preocupação da arquitetura com a saúde e o bem estar dos usuários. Inicialmente, ela foi aplicada para analisar e avaliar as características de espaços de aprendizagem e ambientes hospitalares, uma ferramenta utilizada por arquitetos e arquitetas para entender melhor como melhor projetar programas arquitetônicos específicos. Mais recentemente, a psicologia ambiental passou a ser utilizada também para investigar como os espaços arquitetônicos afetam a nossa saúde mental, levando os arquitetos a explorarem novos conceitos e metodologias científicas em seus projetos. Nesse sentido, o Centro de Desenho Urbano e Saúde Mental surgiu como uma resposta ao crescente interesse por parte dos profissionais da industria da construção civil, promovendo o desenvolvimento desta área de estudo na arquitetura e estabelecendo um diálogo entre os projetistas e os formuladores de políticas públicas com o objetivo comum de promover a saúde e o bem estar das pessoas.

Informando os Processos de Projeto

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3XN's Sydney Fish Market. Image Courtesy of MIR

Incorporar as ciências sociais nos processos de projeto nos permite melhor compreender a importância do design centrado no usuário. O departamento de pesquisa do escritório de arquitetura 3XN, o GXN, emprega uma equipe multidisciplinar de arquitetos, antropólogos e cientistas sociais, e está encarregado de explorar novas formas de moldar o comportamento das pessoas através dos espaços construídos, apropriando-se de novos conceitos e estratégias que surgem desta simbiose entre as ciências sociais e a arquitetura. Desta forma, a equipe de pesquisa do GXN desenvolveu uma série de ferramentas específicas, as quais podem ser aplicadas no desenvolvimento de estratégias de projeto centradas no usuário. O Projeto para o Mercado do Peixe de Sydney, desenvolvido pela 3XN, foi desenvolvido considerando o resultado da pesquisa desenvolvido pelo departamento de pesquisa em ciências sociais do escritório, enquanto o projeto de uso misto Church + Wellesley, foi desenvolvido pela equipe do 3XN através de um processo colaborativo envolvendo a comunidade local, o qual foi conduzido pelos pesquisadores do GXN.

Moldando o Futuro do Espaço Construído

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ARPA by (ab)Normal & Ludwig Engel for Oslo Architecture Triennale 2019. Image Courtesy of Oslo Architecture Triennale

O pensamento especulativo é um elemento intrínseco à arquitetura; entretanto, ao longo das últimas décadas, esta abordagem ganhou vida própria, estabelecendo-como um elemento integral da prática da arquitetura. Ludwig Engel, futurólogo e urbanista responsável pelo projeto ARPA na Trienal de Arquitetura de Oslo de 2019 e pelo Pavilhão 2038 /The New Serenity para a Bienal de Arquitetura de Veneza deste ano, é o cofundador do Interdisciplinary Forum Neurourbanism, um grupo de trabalho de professores universitários, cientistas e profissionais das áreas de psiquiatria, planejamento urbano, psicologia, neurociência, arquitetura, sociologia, filosofia e etnografia, o qual explora e desenvolve projetos voltados para o futuro das cidades, com foco no bem estar físico e mental dos usuários. A equipe multidisciplinar do Neuroubanism procura desenvolver ferramentas que possam auxiliar arquitetos e fazedores de políticas públicas a tomarem decisões mais certeiras, eficientes e sustentáveis em seus projetos, promovendo a qualidade de vida e a saúde física e mental dos usuários no espaço construído.

Sem dúvida, as ciências sociais apresentam uma enorme contribuição para a disciplina da arquitetura, nos permitindo enxergar a realidade com outros olhos, ora reforçando a nossa intuição ora colocando por terra falsas suposições. A integração das ciências sociais na arquitetura e seus processos, portanto, contribui para o estabelecimento de uma prática de projeto baseada no conhecimento empírico e não em meras suposições abstratas, resultando assim, em uma prática profissional mais adequada às reais necessidades das pessoas e suas comunidades.

Este artigo é parte do Tópico do ArchDaily: Arquitetura Multidisciplinar. Mensalmente, exploramos um tema específico através de artigos, entrevistas, notícias e projetos. Saiba mais sobre os tópicos mensais. Como sempre, o ArchDaily está aberto a contribuições de nossos leitores; se você quiser enviar um artigo ou projeto, entre em contato.

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Sobre este autor
Cita: Cutieru, Andreea. "Como as ciências sociais estão ajudando a transformar o espaço construído" [How Social Sciences Shape the Built Environment] 26 Jun 2021. ArchDaily Brasil. (Trad. Libardoni, Vinicius) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/962790/como-as-ciencias-sociais-estao-ajudando-a-transformar-o-espaco-construido> ISSN 0719-8906

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